Hidrelétricas ameaçam o equilíbrio da natureza no Pantanal

Os pescadores são unânimes: a construção de barragens provoca uma queda drástica na quantidade de peixes. Mas as secretarias de Meio Ambiente não pretendem barrar o plano de expansão das hidrelétricas.




A construção de hidrelétricas no Pantanal preocupa moradores e ambientalistas por causa do risco ao equilíbrio de uma das regiões mais bonitas do Brasil.
Os repórteres Tonico Ferreira e Hélio Gonçalves foram até lá e mostram a situação em duas reportagens. A primeira pode ser vista no vídeo ao lado.
O Pantanal é um lugar privilegiado. Raras paisagens deste planeta podem mostrar essa combinação exuberante de água, vegetação e animais. Mesmo quem nasceu e sempre viveu no lugar se encanta. “O Pantanal para mim é uma coisa maravilhosa, que Deus deixou para o ser humano cuidar”, afirma a pantaneira Cleonice de Moura.

Mas Cleonice, terceira geração de família pantaneira, está pessimista quanto ao futuro do Pantanal: “É igual você ter um ente querido e vê-lo em cima de uma cama, morrendo e você sem poder fazer nada”.
Queimadas, exploração agropecuária desordenada e pesca predatória. Essas ameaças são conhecidas. Hoje, no entanto, ambientalistas apontam para um problema novo: a construção de hidrelétricas na região.
As usinas tiram proveito da queda natural entre o Planalto Central do Brasil e a planície onde fica o Pantanal. Hoje, já existem 37 barragens em rios que alimentam a região e estão em construção ou em estudos mais 62 hidrelétricas - quase todas pequenas centrais que produzem pouca energia.
O pesquisador Paulo Petry, de uma entidade internacional de proteção do meio ambiente, diz que as usinas alteram o regime anual de cheias e secas que é responsável pela biodiversidade do pantanal. Ele compara os barramentos a coágulos na circulação sanguínea de uma pessoa. “Eles mudam a qualidade da água que está descendo, eles mudam a periodicidade que a água que está descendo e eles mudam o volume de água que está descendo”, afirma o pesquisador.
O município de Barão de Melgaço já foi um dos maiores produtores de peixe de água doce do Pantanal. Os pescadores das margens do Rio Cuiabá tiravam os pintados, os pacus, que eram vendidos em vários estados do Brasil. Já não é assim. Muita coisa mudou pela região.
Os pescadores são unânimes: a construção de uma barragem rio acima provocou uma queda drástica na quantidade de peixes.
“Há tempos atrás, você pegava, vamos supor, oito pintados por dia. Hoje, você pega dois. Tem dia que você não pega nenhum”, conta João Antônio da Silva, líder comunitário.
E a pesca predatória? Ela também não seria culpada? O especialista em comportamento de rios diz que no passado sim, mas que hoje a pesca está controlada e que o problema agora são as barragens, porque elas isolam os peixes das áreas de reprodução. “Eles não estão conseguindo mais chegar aonde eles chegavam antes e a água não tem mais as mesmas características quando eles sobem os rios”, destaca o geólogo Albano Araújo.
As secretarias de Meio Ambiente de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, responsáveis pela aprovação de quase todas as usinas da região, negam a existência de um grande impacto ambiental. E não pretendem barrar o plano de expansão das hidrelétricas.
“Nós precisamos de estudos científicos, de algo concreto a fim de que possamos mudar procedimentos”, afirma Alexander Maia, secretário de Meio Ambiente – MT.
“Até o momento, não existe nenhum estudo que indique alguma coisa de alto risco, ou coisa que o valha”, declara Carlos Alberto Said Menezes, secretário de Meio Ambiente - MS.
As usinas também são acusadas de destruir belezas naturais.
A cachoeira Sumidouro do Rio Correntes já foi a maior atração turística da cidade de Sonora. Mas a barragem Ponte de Pedra desviou 70% do volume de água para as comportas. Com apenas 30%, o lugar ainda é bonito, mas perdeu a antiga força natural que maravilhava os turistas que vinham de longe para conhecer este lugar.
“Aqui passava o rio, com um grande volume de água, num barulho que você não conseguia falar, você ficava longe da margem porque tinha uma fumaça de água que não deixava você se aproximar, você se molhava e a área era restrita, tinha alguns pontos que você não poderia chegar perto devido ao volume de água que passava”, conta Jorceley Teodoro da Silva, agente de turismo.
A empresa dona da usina explica: “Isso foi discutido na época do projeto, todos sabiam que ia perder essa beleza natural, infelizmente é o preço que nos temos que pagar. Houve as compensações. Você não consegue gerar energia elétrica se você não aproveitar essa queda natural que existe”, afirma José Lourival Magri, gerente de meio ambiente da usina.
O Pantanal precisa atrair e não espantar turistas. A pantaneira Cleonice, que tem uma pousada, diz que a diminuição de peixes pôs em crise o turismo da pesca em muitos rios. O temor agora é que as usinas ponham em risco o ecoturismo, que está apenas engatinhando.
“Tem garça passeando, tem colhereiro. Mas não tem quem vai aplaudi-los. As capivaras daqui fazem pose, você sabia?”, conta Cleonice Dias de Moura, pantaneira.
Os pássaros, os macacos, os cervos, os jacarés, os peixes ornamentais ainda preservados estão à espera dos turistas. E sim: as capivaras do Pantanal fazem pose para fotografia.

Comentários

Postar um comentário